sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Direito de matar ou direito de morrer

A Eutanásia é ainda um tema tabu na sociedade, porque mexe com a ética, a moral, os sentimentos religiosos e de modo geral está relacionado com uma coisa a que ninguém escapa, a morte. A eutanásia assenta em dois pressupostos: implica tirar a vida a alguém e a vida é tirada para o benefício dessa pessoa, que normalmente sofre de uma doença incurável ou terminal. Faremos bem em compreender que a filosofia de preservar a vida a qualquer preço não se limita aos técnicos na área da saúde. É um produto natural da moderna filosofia secular. Porquê? Porque se a vida actual é tudo o que existe, então parece que a nossa vida pessoal deveria ser preservada a qualquer preço e sob todas as circunstâncias. Mas a verdade é que esta filosofia em alguns casos tem resultado em verdadeiros pesadelos técnicos – pessoas inconscientes que são mantidas “vivas” durante anos, por meio de aparelhos.
Por outro lado, existem aqueles que crêem na imortalidade da alma. Segundo a filosofia deles, esta vida é apenas uma passagem, a caminho de algo melhor. Platão, um dos originadores desta filosofia, sustentava: “Ou a morte é um estado de inexistência e de completa inconsciência, ou como dizem os homens, há uma mudança e migração da alma deste mundo para outro….Bem, se a morte é de tal natureza, eu diria que morrer é lucrar.”
Em que casos considero a Eutanásia necessária? Primeiro, temos que reconhecer que cada situação que envolva uma doença terminal é diferente, tragicamente diferente, e não existem regras universais. Mas penso que somente quando se trata inegavelmente de uma doença terminal, uma situação em que claramente determina que não há mais esperança, se deveria considerar um pedido para que se descontinue o emprego da tecnologia para manter a vida.
Mas se houver desacordo no diagnóstico ou no prognóstico, ou em ambos, deveria dar-se maior valor ao manter a vida até que haja acordo razoável. Refiro-me aqui á Eutanásia passiva. Quer dizer, retirar o tratamento de suporte à vida, quando não há mais nada a fazer, por o paciente estar já num processo de morte, retirando-lhe assim o seu sofrimento. Não há necessidade de prolongar um processo de morte que já está bem avançado utilizando meios extraordinários (e talvez custosos) para prolongar o processo da morte. Em tal caso, permitir que a morte siga desimpedida o seu curso não violaria qualquer lei.
Quanto á Eutanásia positiva ou activa, levanta questões sérias ao nível da ética médica, dos sentimentos religiosos e até ao nível dos interesses económicos. Na verdade, estes problemas desafiam a consciência dos médicos que se sentem obrigados a observar as convicções morais, éticas e religiosas, as suas e as dos doentes.
Podemos perceber isso, olhando um pouco para o caso da Holanda o primeiro país da Europa a legalizar a Eutanásia. Num estudo realizado pela Universidade de Göttingen, os sete mil casos de Eutanásia praticados na Holanda, justifica o medo dos idosos de terem a sua vida abreviada a pedido de familiares. Em 41% destes casos, o desejo de antecipar a morte do paciente foi da sua família. 14% das vítimas eram totalmente conscientes e capacitados até para responder por eventuais crimes na Justiça.
É certo que a lei na Holanda determina que a Eutanásia só pode ser permitida por uma comissão constituída por um jurista, um especialista em ética e um médico, e que na falta de um tratamento para melhorar a situação do paciente, o médico é obrigado a pedir a opinião de um colega. Mas na prática a realidade é outra, na realidade esta decisão é muitas vezes realizada à porta fechada entre médico e familiares dos doentes. Depois de se tornar o primeiro país a legalizar a eutanásia, a Holanda prepara-se agora para pôr em prática uma polémica lei que prevê a eutanásia em crianças.
A Eutanásia activa, além de configurar um ilícito penal na maioria dos países, é uma violação dos princípios médicos que entre outras coisas estão obrigados a guardar absoluto respeito pela vida humana, actuando sempre em benefício do doente. Os médicos por respeito á ética médica não podem usar quaisquer meios destinados a abreviar a vida do enfermo. De modo que devem usar todos os meios disponíveis para suportar a vida. Mas isso não significa que precisam usar meios extraordinários ou despropositados, quando se tem a certeza de que não há mais esperança de vida. Eles poderão fazer o seu melhor para aliviar as possíveis dores da pessoa, até ao fim da vida desta.
Nos casos em que é o próprio doente a pedir a eutanásia, ou porque deixou por escrito o seu desejo ou porque está consciente e pede tal coisa, o que fazer? É sem dúvida um caso delicado, mas se a classe médica está convencida de que não há esperança de vida, em vez de praticar a eutanásia activa, poderia aliviar as possíveis dores da pessoa e deixar o processo de morte seguir o seu curso, sem usar quaisquer meios extraordinários para manter inutilmente a vida da pessoa.
A posição de alguns países sobre a Eutanásia
Na Europa, apesar de apenas Holanda e Bélgica, terem legalizado a Eutanásia de modo geral existem leis muito benevolentes. Na Rússia não há penalidades. Na Suíça, Áustria, Noruega, Republica Checa e Itália, as penas são atenuadas. Em França, existe desde 22 de Abril de 2005 a lei de "deixar morrer" e na Suíça o médico pode dar a um doente terminal e que deseje morrer uma dose fatal de medicamento para que ele mesmo ingira.
Em Portugal o Código Penal Português, artigo133 e 134 prevêem uma limitação de pena de seis meses a três anos, quando houver pedido do paciente, e de um a cinco anos, quando movido por compaixão, emoção violenta, desespero ou outro valor relevante social ou moral. Já o novo Código Deontológico dos Médicos, recentemente aprovado, no capitulo 59, proíbe "a ajuda ao suicídio, a eutanásia e a distanásia". No entanto, o "uso de meios extraordinários de manutenção da vida não deve ser iniciado ou continuado contra a vontade do doente", explicitando não se considerarem como meios extraordinários a hidratação e a alimentação. Os meios "extraordinários" para manter a vida devem ser interrompidos nos "casos irrecuperáveis de prognóstico seguramente fatal e próximo, da continuação de tais terapêuticas não resulte benefício para o doente.
Considerações finais
A autonomia no direito a morrer não é permitida em detrimento das regras que regem a sociedade, o comum.
Do ponto de vista religioso a eutanásia é tida como uma usurpação do direito à vida humana, devendo ser um exclusivo reservado ao Criador.
Desde o século IV os médicos, ao terminarem os seus estudos e ao iniciar a profissão, costumam realizar um juramento. Algo como uma promessa de fidelidade profissional. É conhecida como o “juramento de Hipócrates”. E diz assim: “Enquanto possa e saiba, usarei as regras dietéticas em proveito dos doentes e afastarei deles todo o dano e malefício. Jamais darei a alguém medicamento mortal, por muito que mo solicite, nem administrarei abortivo a qualquer mulher…”. O médico que se atreve a realizar a eutanásia comete perjúrio.
Portanto da perspectiva da ética médica, tendo em conta o juramento de Hipócrates, segundo o qual considera a vida como um dom sagrado, sobre a qual o médico não pode ser juiz da vida ou da morte de alguém, a eutanásia é considerada homicídio. Cabe assim ao médico assistir o paciente, fornecendo-lhe todo e qualquer meio necessário à sua subsistência.
Para além disto, pode-se verificar a existência de muitos casos em que os indivíduos estão desenganados pela medicina tradicional e depois procurando alternativas conseguem curar-se.
Um outro factor a ter em conta é que o aumento sem precedentes do número dos idosos e o enorme custo de cuidar dos idosos, nos países desenvolvidos, podem induzir a vindoura geração a requerer uma eutanásia “terapêutica”. Não pensemos que a matança calculada dos velhos é tão absurda como parece, porque uma geração que já aceitou prontamente a ideia do aborto como mecanismo eficiente e moralmente neutro do lado do nascimento, aceitará prontamente a eutanásia ‘terapêutica’ como mecanismo para acabar com o excesso de população, do lado da morte. Quão irónico seria, se os que agora advogam a matança de crianças por nascer pelo aborto fossem eles mesmos mortos por “eutanásia ‘terapêutica’”, se tal medida fosse adoptada no futuro!

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